26/10/2006 09:25:08
Por confiar em um novo ciclo de crescimento da renda do setor rural no país a partir da safra atual (2006/07), o Banco do Brasil reiterou sua opção "pedagógica" de vincular a liberação do crédito de custeio à contratação de seguro rural, e planeja estender a exigência a operações de hedge nos mercados futuros.
Na avaliação dos dirigentes do BB, o setor precisa de mecanismos de travamento de preços em bolsas para driblar as bruscas oscilações que têm resultado em sucessivas crises de renda. "Ainda que haja resistência, só vamos financiar quem aderir. É uma questão pedagógica, um programa para viabilizar o país", diz o diretor de Agronegócio do BB, Derci Alcântara. "E, se tudo der certo, já na próxima safra poderemos usar os mecanismos de hedge de preços no custeio".
E essa política é prioridade no atual governo. No fim de agosto, foi aprovada uma linha de crédito de R$ 100 mil por beneficiário para financiar o ingresso e a manutenção dos produtores nos mercados de futuros e opções, com juros de 8,75% ao ano subsidiados pelo Tesouro Nacional. O plano de safra também prevê um adicional de 15% no crédito de custeio para quem optar pelo hedge em mercados futuros.
O diretor do BB entende que um instrumento de gestão de risco, como o hedge de preços, melhorará os ganhos de produtividade do setor. "É o momento de um salto de qualidade. Precisamos sair da faixa dos 120 milhões de toneladas de grãos e de mais investimentos", afirma. "O setor não tem um colchão de liquidez para segurar ciclos negativos. Por isso os bancos não entram forte no financiamento".
O Banco do Brasil aposta no início da recuperação do setor nesta safra, o que dará fôlego aos produtores para pagar as contas, saldar dívidas renegociadas e pensar em investimentos. Mas Derci Alcântara ainda aponta problemas em Mato Grosso, sobretudo na soja e no milho. "Mas o algodão já está bem melhor", diz. A grande maioria dos estados, segundo ele, deve ter boa rentabilidade. "Se preços, custos de produção, câmbio e condições climáticas forem favoráveis, teremos um bom alívio", diz ele.
Ainda que encarada como solução de longo prazo, a vinculação do seguro ao custeio teve um efeito colateral: o atraso no financiamento da atual safra. Nos quatro primeiros meses deste ciclo 2006/2007, entre julho e outubro, foram emprestados R$ 7,54 bilhões, um desempenho 15,4% inferior aos R$ 8,7 bilhões desembolsados em igual período de 2005.
A concentração dos empréstimos em outubro mostram o tamanho do problema. Até setembro, haviam sido liberados apenas R$ 4,1 bilhões. Para igualar a performance de 2005, o BB prevê desembolsar R$ 4,5 bilhões ao longo de outubro, chegando a R$ 8,66 bilhões até o fim deste mês.
Com algumas exceções, onde houve pressão por mudanças no percentual de cobertura e no valor do prêmio pagos pelos produtores, quase todas as operações de custeio foram contratadas com o amparo da proteção contra problemas climáticos. Na média, a cobertura ficou em 50% da produção e o prêmio, em 2,5% do valor segurado. O Tesouro banca metade do prêmio para estimular a contratação. A obrigatoriedade do seguro passou a valer inicialmente para os produtores de soja e milho nos estados do Paraná, São Paulo, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
Mas não foi apenas o seguro o vilão do atraso. O complexo processo de renegociação das dívidas rurais também pesou. Prevista no pacote de socorro ao setor anunciado em maio, a renegociação incluiu R$ 12,2 bilhões em débitos de 283,1 mil contratos. Até esta semana, o BB havia repactuado R$ 11,4 bilhões de 273 mil contratos - ou 93% do valor potencial. O principal problema ainda está no refinanciamento das Cédulas de Produto Rural (CPRs). Dos 7,5 mil contratos, que somavam R$ 790 milhões em dívidas, somente 5,1 mil foram renegociados, ou R$ 530 milhões. "A trava está na necessidade de transformar o penhor em garantia real com hipoteca e nova avaliação de ativos", diz Alcântara.
Fonte: Valor on-line, 26 de outubro